Na sequência de um comunicado publicado na página de Facebook da Polícia Judiciária intitulado “𝐏𝐫𝐚𝐢𝐚 – 𝐒𝐮𝐬𝐩𝐞𝐢𝐭𝐨𝐬 𝐝𝐞 𝐡𝐨𝐦𝐢𝐜í𝐝𝐢𝐨 𝐝𝐞 𝐦𝐞𝐧𝐨𝐫 𝐧𝐚 𝐫𝐮𝐚 𝐝𝐞 𝐃𝐣𝐢𝐥𝐚 𝐝𝐞𝐭𝐢𝐝𝐨𝐬 𝐩𝐞𝐥𝐚 𝐏𝐉 𝐬𝐚𝐞𝐦 𝐝𝐨 𝐭𝐫𝐢𝐛𝐮𝐧𝐚𝐥 𝐬𝐞𝐦 𝐦𝐞𝐝𝐢𝐝𝐚𝐬 𝐝𝐞 𝐜𝐨𝐚çã𝐨”, o que poderá inculcar a ideia de que o Tribunal de forma ligeira soltou os detidos, o CSMJ vem prestar o seguinte esclarecimento ao público:
- O comunicado, amplamente divulgado nas redes sociais e nos meios de comunicação, assume uma narrativa com juízos de valor sobre os factos e os suspeitos, apresentando-os como “indiciados”, e terminando com uma referência expressa ao facto de que os arguidos foram “soltos, sem qualquer medida de coação”, numa formulação que, infelizmente, poderá ser lida como uma crítica velada à decisão judicial proferida no âmbito do primeiro interrogatório.
- O CSMJ compreende o dever das autoridades de manter a população informada. Todavia, importa que as comunicações públicas das entidades de investigação, preservem a contenção e a neutralidade que o Estado de Direito exige, em especial quando estão em causa processos pendentes. Porquanto,
- A Constituição da República de Cabo Verde (adiante CRCV) dispõe que o “direito à liberdade dos cidadãos é inviolável” (art. 29º, 1) e que (art. 30º, 2 e 3, b) “Ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória (…) ou em caso de detenção ou prisão preventiva por fortes indícios da prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão, cujo limite máximo seja superior a três anos (…)”.
- Dispõe também o artigo 261º/2 do Código de Processo Penal (CPP) que “a aplicação da prisão preventiva dependerá da comprovada existência de fortes indícios da prática de um crime por parte do suspeito ou do arguido”.
- No caso sub judíce, o juiz que presidiu ao primeiro interrogatório dos arguidos detidos concluiu que, face aos elementos de prova carreados para os autos, os indícios sequer existiam e, de acordo com a sua convicção, decidiu não aplicar qualquer medida de coação aos suspeitos.
- Cumpre frisar, por oportuno que a CRCV, no seu artigo 35º, 1 dispõe que “Todo o arguido presume-se inocente até ao trânsito em julgado de sentença condenatória (…)”.
- Assim, não se pode pretender, como parece ser o caso, que a prisão preventiva ou outras medidas de coação sejam vistas como uma espécie de antecipação da pena a aplicar aos cidadãos que, ainda, apenas são suspeitos, com a agravante de os indícios serem considerados frágeis.
- Não decorre para o juiz nenhuma obrigação legal de aplicação de medidas de coação, A NÃO SER QUE OS INDÍCIOS DA PRÁTICA DO CRIME SEJAM FORTES, o que não foi o caso, pelo menos, a julgar pela convicção do juiz que presidiu o primeiro interrogatório e cujos fundamentos estão bem expressos no despacho proferido na sequência do primeiro interrogatório;
- Se por um lado o Tribunal não pode, de forma ligeira, soltar suspeitos da prática de crimes graves não é menos verdade que o Tribunal, de igual modo, não pode de forma ligeira coartar a liberdade dos cidadãos, devendo haver sim a devida ponderação dos valores em pauta, com preponderância, em caso de dúvida, do direito a liberdade (cfr. Art. 29º, 1, 30º,1, 2 e 3 da CRCV).
- O CSMJ apela a todos a um esforço de contenção e a deixarem as instituições funcionar, com normalidade, com serenidade, com legalidade, com apelo à razão, sem emoção, e com respeito à independência funcional dos juízes, sem esquecer que, quem não se conformar com a decisão do juiz, resta-lhe sempre a via legal que é recorrer para suscitar a reapreciação do caso perante um Tribunal Superior e;
- NUNCA, JAMAIS, julgar os cidadãos na Praça Pública.
Praia, 28 de julho de 2025.
A Assessoria de Imprensa do Conselho Superior da Magistratura Judicial